A CULPA É DO FIDEL
- círculo de giz
- 31 de mai. de 2020
- 3 min de leitura
Wallace da Costa Brito*
A culpa é do Fildel! (La faute à Fidel!) é um drama francês, com inteligentes pitadas de humor. Produzido em 2006, este longa metragem dirigido por Julie Gravas tem como protagonista a personagem Anna de La Mesa (Nina Kervel-Bey), digna de aplausos pela brilhante atuação.
A trama se passa na França, entre os anos 1970-73. Anna é uma menina aparentemente de nove anos, com uma vida abastada e tranquila, concentrada entre a família e os estudos na escola religiosa (católica). Tem um irmão, mais novo que ela, o pequeno François, seu pai é um advogado e sua mãe escritora de uma famosa revista.
Após a prisão e morte de um tio espanhol, militante comunista, pela ditadura de Franco, na Espanha, acontecem diversas mudanças em seu quadro familiar. Os pais de Anna se engajam na militância de esquerda, voltando a viver seus ideais até então sufocados, apoiando a luta pela reeleição de Salvador Allende, no Chile. A Família sai de uma ampla casa e se muda para um pequeno apartamento, ocorrendo uma grande mudança funcional, financeira e ideológica. Na nova moradia, passa-se a maior parte da trama, acontecendo inúmeras reuniões dos militantes comunistas de origem sul-americana, que moram na França e trabalham pela eleição de Allende. Completamente envolvidos nesta empreitada, os pais de Anna não conseguem lhe dedicar a devida atenção.
O nome do filme se deve a fala de uma empregada cubana da família, que detestava Fidel Castro. Em meio a todo agito que ocorre na família, a certa altura, ela diz para Anna: “A culpa é do Fidel!”.
Anna é uma menina de classe média alta francesa, criada dentro dos moldes e valores capitalistas (digamos mais tradicionais), rígido, normativo, autoritário, meritocrático, com ideais que valorizam a individualidade, a competitividade, o lucro e a punição. Podemos constatar essas afirmações no começo do filme, onde a menina, bem adaptada que estava à sua rotina diária, na escola religiosa, manifesta-se ávida por boas notas e voltada para um alto nível de competitividade, como se faz notar em uma prova de natação.
Anna apresenta uma falta de interesse por brincadeiras próprias para uma criança de sua idade, vivendo uma vida de adulto com todas as formalidades e trivialidades que vê em sua família e na avó. Mostra-se uma menina inteligente, questionadora e resistente às mudanças ocorridas no seu cotidiano. Vive certa insatisfação, mas com o passar do tempo, sente-se marcada por inúmeras dúvidas e questionamentos, o que a faz, aos poucos, ceder às novas circunstâncias presentes no ambiente no qual está inserida, passando a ter uma diferente compreensão do mundo e das possibilidades de ver e viver a vida. Com as recentes vivências no cotidiano familiar, reforçadas pela nova escola que passa a frequentar, passa a conhecer e vivenciar conceitos outros de cidadania, solidariedade, amizade, coletividade, enfim, de outra consciência social e de si mesma neste contexto. Aprende a gostar de brincar e ser criança. Aceita e compreende a nova realidade e passa a perceber que existem outras histórias de vida além da sua, ao tomar contato com diferentes pessoas e culturas por intermédio das empregadas. Com isso, passa a refletir a partir dos conhecimentos e experiências obtidos nesses relacionamentos, o que a favorece na ampliação da sua visão de mundo, aprendendo o significado de espírito de grupo, algo que até então desconhecia.
Referência:
A CULPA é do Fidel. Direção: Julie Gravas. Produção: Sylvie Danton. Intérpretes: Julie Derpadieu, Stefano Accorsi e Nina Kervel-Bey e outros. Roteiro: Julie Gavras, com colaboração de Arnaud Cathrine. Música: Armand Amar. França / Itália: Les Films du Worso, c 2006. 1 DVD (99 min), widescreen, color.
*Wallace da Costa Brito é psicólogo, mestre em Psicologia (UFRRJ) e professor da UNIGRANRIO.
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