CÍRCULO DE GIZ REVISTA MULTIDISCIPLINAR DE ARTES E HUMANIDADES ISSN 2696-9020 / 2446-757X (IMPRESSA)
Número 4
A tempestade que chamamos de barbárie
A imagem escolhida para a capa deste número da revista, Convocatoria a la barbarie, de 1961, pretende chamar, a um tempo, à entrevista com “Yuyo” Noé e à própria revista, como um todo. Um chamado à barbárie – que não foi vencida, em 2022, pela civilização; que não é mera oposição antitética à cultura; que não é predicado “deles”, daqueles outros do lado de lá. Se, ainda hoje, estamos às voltas com aquela pergunta desconcertante de Adorno – como e por que a poesia depois da Shoá –, sem qualquer esboço de resposta satisfatória, talvez seja porque o “hoje” é, insistentemente, “ainda”: ainda sob a sombra do nazismo, “ainda não” o mundo em que o humano troca amor somente por amor. [Trecho do editorial]
Sumário
Notas sobre a nuvem de gafanhotos de escritas: informação, história e poder
Leopoldo Guilherme Pio
O texto propõe refletir sobre o regime de informação contemporâneo e a produção de novos modos de percepção, de afetação e de existir subjetivamente. Considerando a diferença entre “narração” e “informação”, como proposta por Walter Benjamin, compreende-se que a configuração da comunicação na contemporaneidade se manifesta a partir do choque, do impacto e do apelo; uma produção acelerada de informação que nos invade e nos interpela à sua onipresença, tal qual uma nuvem de escritas cada vez mais densa.
A massificação da desinformação e a precarização da consciência social: fake news, pós-verdade e a política dos afetos
Sergio Luiz Pereira da Silva
Nesse texto refletimos sobre a precarização da consciência e a perda de seu poder de autonomia crítica, frente ao processo da ideologia da desinformação e da pós-verdade. A perda da autonomia da consciência crítica é algo que vem ocorrendo de forma massiva, através da cultura industrial das fake news, no capitalismo neoliberal das plataformas digitais, o qual tem se mostrado como palco de pelejas política e afetivas entres sujeitos, que cada vez mais vêm se transformado em indivíduos usuários.
O sol de cada dia no simulacro midiático
Fábio Mário Iorio
O artigo estabelece o debate teórico jornalístico na redefinição da Notícia como produtora da versão de fatos cotidianos que constrói o sentido (precário) da realidade, ao percorrer as tópicas de outros dois conceitos matriciais: a mercadoria primordial da indústria cultural e a simulação midiática do espetáculo, contextualizando assim o enredo social neoliberal contracenado por personagens da dita era hipermoderna.
Walter Benjamin e a história do tempo presente
Josias José Freire Jr.
O texto tem por objetivo desenvolver algumas reflexões acerca do tema do presente para a história. Inicialmente, se discutirá alguns aspectos da chamada história do tempo presente, com intuito de apresentar o problema do presente na história, a partir desse campo historiográfico. Em seguida, serão consideradas algumas ideias do filósofo alemão Walter Benjamin (1892-1940) acerca do presente e da atualidade, em seu conceito de história. Compreende-se que as considerações de Walter Benjamin sobre a história e, especificamente, sobre o papel do presente e da atualidade em história, possam contribuir com as reflexões e debates do campo da história do tempo presente.
Frantz Fanon e a violência da descolonização
Marcelo Fonseca
O artigo pretende fazer uma leitura do tema da violência conforme trabalhado por Frantz Fanon no primeiro capítulo do seu livro Os Condenados da Terra, guiando-se pela dialética da (des)colonização, posta em cena por Sartre no prefácio do livro, e estabelecendo conexões com a realidade brasileira, sobretudo com uma leitura de Brasil elaborada na obra e no pensamento de Glauber Rocha.
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Encruzilhadas, pontes e percalços: acerca do ensino de Psicologia Médica para estudantes de Medicina com base no referencial teórico psicanalítico crítico
Alexandre M. T. de Carvalho
O ensino de Psicologia Médica com base no referencial teórico psicanalítico se depara com obstáculos afetivos, cognitivos, epistemológicos e político-pedagógicos relacionados à compreensão da dimensão subjetiva da realidade e às características de uma semiologia médica que privilegia o olhar em detrimento da escuta e a dimensão da objetividade (sinal) às custas da subjetividade (sintoma). Neste artigo, destaca-se a experiência docente com estudantes do quarto período de um curso de graduação em Medicina em uma Instituição Federal de Ensino Superior, bem como o trabalho resultante do projeto de ensino “Psicanálise e Psicologia Médica”, envolvendo monitoras(es).
[Acesse o artigo]
Clínica psicanalítica e a saúde mental
Yuri Joaquim de Carvalho
Edimilson Duarte de Lima
O artigo busca pensar a dinâmica entre a clínica psicanalítica e a instituição pública brasileira de saúde mental na atualidade. Para isso, perfaz um percurso histórico-social que vai, de forma cíclica, sendo moldado e articulado com inúmeras questões relativas à clínica psicanalítica em si.
Processo de criação, pandemia e vaga-lumes
Camila Fersi
Este artigo versa sobre o projeto Campo Aberto enquanto processo de criação, experiência de micropolítica ativa e de convívio social. A ação acontece mediada por dispositivos tecnológicos, articulando a simultaneidade dos ambientes reais e virtuais, e tem a dança como disparadora dos ânimos e as técnicas da improvisação e composição como plataformas de voo.
Todos calam. Berna Reale.
Elisabeth Bittencourt
Berna se expõe a uma violência da ordem do real. Impossível de ser simbolizada. Fica sempre um resto. Resto de quê? O real faz fulgurar o seu ato? Brilho do olhar de Antígona. Seu corpo fica à beira de uma profanação. A violência é servida aos nossos olhos de modo indisfarçável. O horror se apresenta.
O caos como estrutura: entrevista com Luis Felipe Noé
Júnior Coruja, Juliana Cunha e Luiza Mader Paladino
Mais longevo e um dos mais relevantes artistas argentinos de sua geração, Luis Felipe “Yuyo” Noé é também professor, ator e testemunha de fatos estéticos – e históricos! – que sacudiram estruturas em solo latino-americano desde os anos 60. Mentor do grupo Otra Figuración, seus trabalhos marcam, para autores como Luis Camnitzer, um passo importante rumo aos conceitualismos da América do Sul, e, para artistas brasileiros do mesmo período, como Rubens Gerchman, Carlos Zílio e Antônio Dias, uma relação de impacto direto em suas produções.
XIV
Danilo Almeida
Esticou as palmas da mão no intuito vão de defender o rosto dos socos do oponente. O baixinho é fogo. E rápido. Num jogo de quadril, impôs ao corpo do maior o chão. A cabeça latejando. As narinas dilaceradas pelas unhadas que levou. Não diriam se tratar briga de mulher, pois o menor tinha um repertório de golpes suficientes para não padecer de tal emblema. No chão, o mais alto ainda teve tempo de notar o braço reluzindo de suor sobre a pele escura. Mas este não se fez de rogado. Encheu o peito de placidez enquanto o sangue ainda ecoava do nariz. Já havia sofrido o bastante. Ergueu-se cambaleante e, contraindo os músculos do quadril, foi para cima do outro.
Seis poemas
Luís Guedes
Fisher-Price; BÊ A BÁ; Na praça; FISSURA; [ ]; CORPO A CORPO.